Machado, do Santander, convidou concorrentes para se tornarem clientes.
A disputa entre os bancos privados para oferecer crédito imobiliário à clientela de alta renda promete esquentar neste ano, em que o financiamento à construção tende ao arrefecimento. E o sinal mais claro desse ambiente concorrencial está na flexibilidade mostrada pelas instituições financeiras nas negociações de taxas de juro com o comprador do imóvel.
No Bradesco, por exemplo, embora a taxa de juro para imóveis com valor superior a R$ 500 mil seja de 11,5% ao ano - mais Taxa Referencial (TR) -, o custo do financiamento pode cair a 10,5% ao ano nas negociações entre cliente e banco.
No caso das operações realizadas no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), para imóveis avaliados entre R$ 171 mil e R$ 500 mil, é também comum que o financiamento saia com desconto. "A média tem sido de 10% ao ano [mais TR] por conta da concorrência", afirma Claudio Borges, diretor de crédito imobiliário do banco. "O cliente está pesquisando todo o custo, do juro ao seguro, e sabe que meio ponto percentual faz enorme diferença, pelo prazo da operação." O custo efetivo de um financiamento imobiliário, segundo Borges, é de 8,5% ao ano.
No Itaú Unibanco, o simulador do financiamento imobiliário usado pelos clientes na internet aplica uma taxa de 11%. No entanto, o juro médio que tem sido praticado está em 10% ao ano (mais TR), segundo o banco. Grande parte dos imóveis lá financiados giram em torno de R$ 600 mil - sendo o valor médio do financiamento de R$ 240 mil. No HSBC, o juro varia de 9,5% a 11% ao ano mais TR, a depender do perfil do cliente. "O foco é usar o financiamento imobiliário como produto de relacionamento e trazer esse cliente para a base", afirma Antonio Barbosa, diretor de crédito imobiliário do HSBC.
Nessa briga entre os bancos privados, sobra até para a Caixa Econômica Federal, que durante anos foi o único agente de financiamento habitacional do país - e não à toa, detém 73,9% de participação de mercado. Os concorrentes argumentam que, como banco público, a Caixa deveria estar focada onde há déficit habitacional, e não em oferecer financiamento a 9% ao ano para o público de alta renda.
"Isso é intriga da oposição", rebate Marcio Percival, vice-presidente de finanças da Caixa. "Quando o PanAmericano [no qual a Caixa detém 36,56% do capital total] começar a trabalhar com financiamento imobiliário, aí sim nossos concorrentes vão sentir a competição", acrescenta. Pessoas com renda mensal superior a dez salários mínimos responderam por 23% dos financiamentos concedidos pela Caixa em 2011.
Como a disposição para dar desconto é geral, os bancos privados lançam mão de outros "benefícios" para conquistar quem está em busca de um financiamento imobiliário. "Oferecemos, por exemplo, cheque especial com taxa competitiva", conta Borges, do Bradesco. Segundo o executivo, o tomador de crédito imobiliário é um cliente fiel, que consome de seis a oito produtos bancários.
O Santander "oficializou" os estímulos com o lançamento, em novembro do ano passado, do pacote "serviços imobiliários Van Gogh". Trata-se de uma conta corrente que oferece isenção da tarifa de serviços administrativos na contratação de crédito imobiliário, condições especiais para aplicações em CDB e taxas reduzidas para plano de previdência privada, possibilidade de pagamento das parcelas do imóvel na planta com o cartão de crédito e até descontos em lojas de móveis e decoração na linha de financiamento ao consumo. O segmento de alta renda do Santander representa 85% da carteira de crédito imobiliário.
Até mesmo clientes "private", com no mínimo R$ 1 milhão depositado em banco, têm mostrado interesse pelo financiamento imobiliário. "Quando esse cliente resolve dar um apartamento de presente para a filha, hoje, pensa duas vezes antes de abrir mão de liquidez e sacar o dinheiro", explica José Roberto Machado, diretor executivo de negócios imobiliários do Santander. No banco espanhol, 3,5% do volume de concessões feitas em 2011 foi para o público de altíssima renda.
De olho nesse filão, a equipe de Machado valeu-se de um expediente no mínimo inusitado para atrair novos clientes: enviou correspondência a diretores de bancos concorrentes, no fim do ano passado, para apresentar as vantagens do financiamento imobiliário do Santander. A lei do colarinho branco proíbe que esses altos funcionários tomem empréstimos na instituição em que trabalham.
A competição ainda está longe de um vale-tudo. Os bancos evitam divulgar (e estimular), por exemplo, a possibilidade de se transferir o financiamento imobiliário de uma instituição para outra - a chamada portabilidade -, para que eles mesmos não sofram os efeitos colaterais da prática. A briga para conquistar o cliente se dá em um estágio anterior, na hora de fechar a concessão do crédito.
No caso dos lançamentos empreendimentos imobiliários, a abordagem da equipe comercial dos bancos é feita durante a fase de obra. O Bradesco financiou, em 2011, a construção de cerca de 75 mil unidades, base que neste ano será usada para prospectar novos clientes pessoas físicas. De acordo com Borges, o banco consegue financiar de 50% a 55% dos compradores de uma obra. Desse total, de 25% a 30% já são correntistas do Bradesco. O desafio está em, justamente, atingir aquele que é correntista de outro banco.
O jogo de rouba monte, no caso dos imóveis usados, envolve uma extensa malha de consultores contratados pelos bancos para atuar nas imobiliárias, junto a corretores. O HSBC tem acordo de exclusividade com a Brasil Brokers, fechado no fim de 2010 e válido por cinco anos. O Itaú criou a financeira CrediPronto! com a corretora Lopes ainda em dezembro de 2007.
Diferentemente do Bradesco e do Santander, nos quais os imóveis novos representam metade dos financiamentos concedidos, no Itaú, os usados respondem por 70% da oferta de crédito e, no HSBC, essa fatia chega a 80%.
O Santander pretende reforçar, neste ano, sua força comercial que atende nas corretoras imobiliárias, das atuais 120 pessoas para 200. Borges, do Bradesco, reconhece que é preciso melhorar a performance nessa frente.
Aos analistas do BTG Pactual, Luiz Antonio França, diretor de crédito imobiliário do Itaú, informou que 37% do crédito a pessoas físicas é originado nas agências do banco; 22% vêm da sociedade com a Lopes na CrediPronto! e da parceria com a corretora Coelho da Fonseca; 26% advêm de parcerias com outras corretoras pelo Brasil; e 15% via repasses de obras financiadas pelo banco. No HSBC, a expectativa é que a parceria com a Brasil Brokers renda, neste ano, R$ 500 milhões em concessões.